Há momentos em nossas vidas em que o véu se desfaz. Momentos em que todas as perguntas que carregamos silenciosamente encontram não respostas, mas algo muito mais profundo: uma compreensão que transcende as palavras e habita diretamente no coração da experiência.
Depois de minha experiência de quase morte, algo em mim se transformou para sempre. Como se uma semente adormecida tivesse encontrado finalmente a luz necessária para germinar. E foi através do autoconhecimento, da meditação e da reconexão com o divino que essa germinação se aprofundou, levando-me a territórios que a mente racional jamais poderia mapear.
O Encontro com o Todo
Tal encontro começou com consagrações de ayahuasca. A princípio, em minha primeira consagração, eu sequer senti a dita “força” como aqueles que vieram antes de mim relatavam. Voltei para casa como se tivesse apenas perdido meu tempo.
Mas por alguma razão que não me fez sentido na época, decidi ir novamente a uma segunda cerimônia. E essa segunda cerimônia me trouxe reflexões tão profundas sobre meu ser, sobre minha experiência enquanto alma e carne, que passei a frequentar mais vezes.
A reconexão com o Todo aconteceu em dois momentos distintos, e devo dizer que é algo tão extraordinário que não há palavras para descrever a grandiosidade dessa presença. É algo que nossa mente racional e egoica pouco pode entender. É algo que somente nosso Eu divino pode sentir e experienciar.
Por alguns instantes eternos, minha mente simplesmente… cessou. Minha respiração começou a se tornar pesada e difícil de concluir, e cada célula de meu corpo vibrava. Em meus ouvidos tocavam sons que são muito difíceis de descrever – uma sinfonia cósmica que ressoa além da compreensão humana.
Sons semelhantes a essa musica:
E em dado momento não havia mais respiração para sentir, não havia mais “eu” para observar. E então, como se sempre tivesse sido assim, me uni novamente ao Infinito. Voltei à casa de nosso grande Divino Pai Eterno.
Lá, onde não existe “lá”. Onde todas as contradições se dissolvem numa harmonia perfeita. Onde ao mesmo tempo tudo e nada são a mesma coisa. Sentia-se tudo e não se sentia nada. Era plenitude absoluta, silêncio que contém todos os sons, amor que não precisa de objeto para existir.
Amor Ágape em sua mais pura forma.
Lá, você simplesmente é. Sem esforço, sem busca, sem desejo de ser mais ou menos do que já é. Sem ego. A vontade de permanecer era natural, como o rio que naturalmente flui para o mar em paz e harmonia. Mas, como todas as marés, há um momento de retorno.
O Despertar dos Sentidos
Quando voltei – e que retorno foi esse! – era como se tivesse nascido novamente, mas desta vez com a consciência plena do milagre que é ter sentidos. A comida possuía sabores como se minha língua nunca houvesse realmente provado tal alimento. O vento na pele era poesia em movimento. Tocar a terra era comungar com algo sagrado. Até mesmo respirar – esse ato tão automático – revelava-se como uma dança cósmica acontecendo dentro de mim.
Por que essas sensações eram tão intensas? Por que voltar do Infinito era simultaneamente uma perda e uma dádiva ainda maior? A resposta não chegou através da razão, mas se revelou lentamente, como uma flor que se abre em seu tempo perfeito.
A Missão de Simplesmente Viver
Durante minha experiência de quase morte, me vi em um lugar infinito, um nada infinito, e lá havia apenas uma mulher. Uma mulher que me acolheu e buscou me orientar sobre tudo que estava acontecendo – como eu havia parado lá e por que eu deveria voltar.
E assim eu fiz. Escolhi retornar.
Depois disso, entrei em uma busca incessante para entender melhor o que havia acontecido. Quem era aquela mulher e por que meu espírito escolhera voltar a tal sofrimento.
Com tudo isso, minha mediunidade começou a florescer cada vez mais, e comecei a ter cada vez mais experiências extracorpóreas – experiências que nossa ciência pouco pode explicar atualmente. Conheci mentores que têm me guiado e ensinado inúmeras coisas desde então.
Em dado momento, fiz a pergunta que tantos fazem diariamente:
“Qual é minha missão? Por que escolhi retornar?”
A resposta de meu mentor espiritual foi de uma simplicidade:
“Sua missão, filha, é viver. É aproveitar tudo o que foi criado por Deus para você experienciar.”
que minha mente complexa inicialmente resistiu:
Como assim? Onde estava a grandiosidade que eu esperava? A missão heroica? O propósito transcendental?
Minha mente protestava: isso não pode ser tudo!
E no entanto, cada vez que retornei àquele lugar que considero o Todo – a mais pura reconexão e proximidade com nosso Divino Pai Eterno, com Deus -, ou então, cada vez que mesmo não estando naquele lugar consegui sentir a plenitude e amor daquele estado, eu voltava com uma fome inexplicável de viver.
Uma urgência amorosa de experienciar cada momento como se fosse o primeiro e o último. Meus problemas se dissolviam diante da magnitude simples de estar viva.
O Amor Ágape – esse amor universal e incondicional – esse amor que Jesus nos mostrou em sua encarnacao – finalmente fazia sentido não como conceito, mas como estado natural do ser.
Buscar me aproximar desse conceito se tornou um incosciente propósito de vida.
A Compreensão que Floresce
Foi preciso tempo. Foi preciso várias jornadas de volta àquela energia para que a compreensão finalmente desabrochasse em minha consciência ordinária.
Algumas verdades não podem ser ensinadas.
Algumas verdades não podem ser racionalizadas.
Algumas verdades não podem ser colocadas em palavras.
Elas simplesmente existem, como o sol e a lua.
E elas devem ser vividas até que se tornem tão óbvias e automáticas quanto o próprio respirar.
Vim de um berço espírita, onde sempre soube intelectualmente que havia escolhido encarnar. Mas conhecer e compreender são territórios completamente diferentes. É a diferença estonteante entre ler sobre o oceano e mergulhar em suas profundezas.
Escolhemos encarnar. Não por castigo, não por necessidade kármica no sentido de dívida, mas por algo muito mais belo: para experienciar.
E veja bem, encarnações kármicas existem. Mas são vistas pela maioria dos espiritualistas como uma dívida com o outro. E isso… isso não existe. A dívida kármica mora em nossa consciência, em termos nos afastado da fonte divina, afastado do amor Ágape e da caridade. em termos feito mal a nossos irmaos. É uma dívida feita contra nossa própria essência e que necessita ser purificada. A reencarnação, assim, se torna uma dádiva. Um presente para que possamos nos curar e retornar a essa grande fonte algum dia.
O Paradoxo Sagrado da Encarnação
No Todo, tudo é Um. Não existe separação entre alegria e tristeza, entre bom e ruim, entre eu e você. Existe apenas o Ser, eterno e imutável, em sua perfeição absoluta. É casa. É paz. É completude.
Mas é justamente essa unidade perfeita que torna a encarnação um milagre único. Aqui, na Terra, nós experimentamos o impossível: a consciência se fragmenta em individualidades que podem se reconhecer, se amar, se perder e se reencontrar.
Essa plenitude infinita nos aguardará sempre – ela nunca foi perdida, nunca esteve ausente. Mas até que retornemos a ela em nosso tempo sagrado, que bênção extraordinária é poder:
- Sorrir e sentir os músculos do rosto se moverem em alegria
- Chorar e permitir que a tristeza lave nossa alma
- Abraçar alguém e sentir o calor de outro corpo humano
- Saborear a comida e nutrir esse templo que habitamos
- Sentir o vento e reconhecer nossa pele como fronteira sagrada entre interior e exterior
- Respirar fundo e sentir os pulmões expandindo, celebrando a vida a cada ciclo
A Dádiva do Esquecimento
Mas por que essa dança aparentemente infinita?
Acredito que escolhemos experimentar tudo o que foi criado através da perspectiva única de cada encarnação. Experienciar tudo e ainda sim lembrar de casa. Lembrar do todo. E sim, às vezes nos perdemos. Às vezes esquecemos quem somos para conseguir assumir esses corpos tao densos.
Mas talvez o esquecimento não seja um erro – talvez seja parte essencial da experiência. Como poderíamos apreciar verdadeiramente a luz se não houvesse a experiência da escuridão? Como poderíamos valorizar o encontro se não experimentássemos a separação?
Cada encarnação é uma obra de arte única da consciência explorando a si mesma. Cada vida é um sonho diferente que o Sonhador escolhe sonhar para conhecer todas as nuances possíveis da experiência.
O Retorno à Simplicidade
E assim, a busca grandiosa por propósito se revela na simplicidade mais radical: estamos aqui para viver. Para experienciar. Para ser testemunhas conscientes do milagre cotidiano de estar em forma humana.
Não há nada para alcançar além daquilo que já somos.
Não há lugar para chegar além de onde já estamos.
A jornada espiritual não é uma fuga da humanidade, mas uma celebração profunda dela.
Cada respiração é uma oração. Cada sensação é uma comunhão com o sagrado. Cada emoção é uma cor diferente na paleta infinita da experiência consciente.
E quando finalmente compreendemos isso – realmente compreendemos, não apenas intelectualmente mas com cada célula do nosso ser – até mesmo o sofrimento se revela como mais uma faceta preciosa dessa experiência extraordinária que escolhemos viver.
Porque no fim, somos o Infinito brincando de ser finito. Somos o Eterno explorando o temporal. Somos uma centelha de Deus experimentando o que é ser humano.
E que privilégio sagrado é esse.

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